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‘Pensei que meu cansaço extremo era depressão, mas descobri que tinha leucemia’

Publicado no portal Globo.com/Marie Claire - Saúde, 13.08.23 Por: Alice Arnoldi


Diagnosticada com leucemia promielocítica aguda (LPA) aos 27 anos, Marcella Côrrea divide sua jornada na internet e ajuda a conscientizar mais pessoas sobre a doença

“Demorei muito para compartilhar com pessoas próximas sobre como estava me sentindo, porque o cansaço extremo me causava vergonha. Me sentia uma preguiçosa”. Foi a partir desse embate que a empresária Marcella Côrrea, de 27 anos, começou a investigar sua saúde até receber o diagnóstico de leucemia promielocítica aguda (LPA).


A falta de disposição era tanta, que Marcella chegou a cogitar a possibilidade de estar com depressão. “Com o tempo, fui entendendo que sentia vontade [de fazer as coisas], mas meu corpo não respondia”, conta.


Ela não conseguia fazer o básico como ir de um cômodo para outro dentro do apartamento, cozinhar ou até mesmo tomar um banho de pé. “Ainda assim, tinha certeza que era apenas cansaço do trabalho”, comenta a empresária, que cogitou a possibilidade de burnout.


Sintomas da leucemia promielocítica aguda


O desânimo não foi o único sinal da doença que Marcella apresentou, embora ela tenha tentado encontrar uma justificativa diferente para cada um deles. A empresária começou a ter manchas roxas por todo o corpo, as quais ela também atribuía ao estresse.


Mais tarde, descobriu que isso acontecia porque a LPA altera o processo de coagulação do organismo.


Não por acaso, Marcella teve uma mudança abrupta do seu ciclo menstrual, e o seu fluxo aumentou significativamente. “Eu tinha mudado de anticoncepcional, então, achei que pudesse ser isso”, justifica.


A hematologista Talita Maira Bueno da Silveira, do A.C. Camargo Cancer Center, explica que sangramentos são os principais indicativos da LPA. “Quando há muita produção de células anormais, a medula deixa de produzir outras células boas. O paciente tem sintomas relacionados a anemia intensa e sangramentos, associados a plaquetas baixas”, detalha a médica.


A empresária também passou a sentir o corpo febril, o que pensava ser um sinal de que ficaria gripada. À noite, essa sensação se intensificava, com uma sudorese excessiva que nunca tinha experimentado antes.


Houve ainda o aparecimento de manchas vermelhas no rosto, que Marcella atribuiu a uma alergia a algum produto que havia usado. “Nosso corpo fala de diversas maneiras, mas preferimos ignorar”, reflete.


A jornada em busca do diagnóstico


Incomodada principalmente com o cansaço, Marcella decidiu buscar por uma nutróloga, já que pensava que a indisposição estava associada à falta de alguma vitamina. “Apesar de não ter falado todos os sintomas para a médica, ela percebeu que tinha algo estranho e logo de cara solicitou inúmeros exames de sangue”, recorda-se a empresária.


Marcella foi surpreendida com uma série de ligações do laboratório. Eles perguntaram se ela fazia algum tratamento de imunidade, porque a dosagem de leucócitos havia dado alterada: “Achei que estavam querendo me oferecer algum tipo de vacina. Não passou na minha cabeça que aquilo era algo sério”.


O laboratório orientou Marcella a procurar por um médico o mais rápido possível e foi o que fez, enviando os resultados dos exames para sua nutróloga. Quando a médica viu os exames, orientou a paciente a repetir os exames no hospital.


Na visita ao local, porém, Marcella foi liberada pelo médico de plantão. A empresária procurou outro hospital, onde foi internada e novos testes foram feitos. Um mielograma, que consiste em uma pulsão da medula óssea, apontou o diagnóstico correto.


Ao receber a notícia, Marcella conta que o seu mundo parou: “Só olhei para os meus pais e comecei a chorar”.


O acolhimento da hematologista, que está realizando o seu tratamento até hoje, ajudou a paciente a enxergar a doença com mais coragem. A empresária, no entanto, se sente insegura: “Tenho medo de não realizar todos os meus sonhos e de não ver meus pais envelhecerem e minha sobrinha crescer”.


Tratamento em curso

Logo após receber o diagnóstico de LPA, Marcella começou a primeira etapa do tratamento: 28 dias seguidos de quimioterapia. “O objetivo desse primeiro ciclo era a doença entrar em remissão, ou seja, ter blastos em menos de 5%. Conseguimos!”, comemora.


Após a primeira fase do tratamento, Marcella ficou nove dias em casa e voltou ao hospital para mais 26 dias de quimioterapia.


O tipo de tratamento da LPA, segundo a hematologista do A.C. Camargo Cancer Center, varia de acordo com os níveis de leucócitos e das plaquetas do paciente.


“Aqueles que não têm leucócitos muito alto e plaquetas muito baixas, ou seja, de risco baixo, são candidatos a fazerem tratamento sem quimioterapia, só com as drogas-alvo”, exemplifica a especialista.


Já os pacientes de alto risco, como Marcella, ainda são submetidos ao protocolo de uma fase de indução e outra de manutenção, com o uso de quimioterapia e drogas-alvo específicas.


Batalha psicológica


A empresária conta que a segunda etapa do tratamento tem sido mais difícil do que a primeira. Além de ter tido mais efeitos colaterais da quimioterapia, como alterações no paladar e olfato, falta de apetite e enjoo, Marcella enfrenta uma luta psicológica.


“O processo é extremamente desgastante. A vida fora do hospital continua, os boletos também, e você se cobra por estar parada. Apesar de estar lutando pela minha vida, às vezes, cansa. Não é porque estou sorridente e confiante que a jornada seja fácil”, desabafa.


Marcella começou a fazer terapia ainda no hospital. Para a psicóloga Marina Vasconcellos, especializada em psicodrama terapêutico pelo Instituto Sedes Sapientiae, a estratégia é fundamental para lidar com os medos que surgem ao receber o diagnóstico de câncer, principalmente o da morte.


Além da terapia, a especialista recomenda às pessoas nessa situação meditação, leitura de histórias motivacionais, busca de grupos de ajuda e trabalhos ligados à espiritualidade — não necessariamente religião. “A maneira como a pessoa encara a doença faz toda a diferença no tratamento. Acreditar em algo e ter um foco positivo ajuda na sua recuperação”, diz a psicóloga.


A busca por um psiquiatra também pode ser importante. A psicóloga explica que o paciente deve procurar pelo médico caso perceba que não está conseguindo responder ao tratamento psicológico e se sinta engolida pela tristeza e pelo medo.


Da vida para a internet


O que também tem ajudado Marcella nesse processo é compartilhar sua rotina no TikTok. Além de trazer mais informações sobre a LPA, a empresária conta que decidiu fazer os vídeos para mostrar a outras pessoas com câncer que não estão sozinhas nessa luta.


A empresária surpreendeu-se com a recepção na rede social. “Não esperava tanta torcida positiva e também não sabia que essa era a realidade de tanta gente com idade parecida com a minha”, revela.


Entre os comentários positivos que tem recebido, ela conta o mais marcante: “A pessoa disse que meu tratamento dura 9 meses, que é o período de uma gestação, porque será o tempo do meu renascimento”.




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