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Estudo britânico comprova: idade não é barreira para a perda de peso



Publicado no portal Globo.com, 12.12.20 Por Gabriela Bittencourt, para o EU Atleta — Aberystwyth, País de Gales Durante uma década, pesquisadores britânicos acompanharam pacientes do Instituto de Warwickshire para estudos do diabetes, endocrinologia e metabolismo e observaram que, quando se adota mudanças no estilo de vida, a idade não exerce grande influência na perda de peso. Todos os participantes do estudo, publicado em outubro, apresentavam inicialmente Índice de Massa Corporal (IMC) superior a 40 kg/m², um indicativo de obesidade mórbida. Dentre os voluntários com 60 anos ou mais, a redução do peso corporal foi de 6,9%, enquanto que o IMC diminuiu em 8,1%. Já no grupo com menos de 60 anos, esses percentuais foram 7,3% e 7,8%, respectivamente. Números próximos, sendo que os mais velhos tiveram até mais sucesso na redução do IMC. Como parte do tratamento, os pacientes incorporaram mudanças no estilo de vida, com foco em dieta e suporte médico e psicológico. O objetivo dos pesquisadores era conhecer os efeitos da idade na capacidade de perder peso. Isso porque esse fator pode ser uma barreira para aceitação de pacientes idosos em serviços dedicados ao tratamento da obesidade. Com base nos resultados, eles concluíram que somente a idade não deve influenciar nessa decisão, uma vez que idosos também podem ter sucesso na redução do peso e do IMC.


Na opinião da médica endocrinologista Maria Fernanda Barca, para os profissionais envolvidos em programas de emagrecimento, a principal mensagem do estudo é que não se pode desistir dos idosos com obesidade mórbida. Afinal, como demonstra a pesquisa, a luta contra a obesidade também pode ser enfrentada por quem está na terceira idade. Isso Barca já observa prática. Doutora em endocrinologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), ela afirma que, com acompanhamento médico, de preferência de endocrinologista, pessoas que passaram dos 60 anos e apresentam quadro de obesidade também têm sucesso na perda de peso. Esse especialista apoiará e orientará o idoso nessa jornada, indicando, por exemplo, as mudanças no estilo de vida e os demais profissionais que podem ser envolvidos no tratamento, como nutricionista e psicólogo ou psiquiatra, além de medicamentos necessários, dependendo do caso.


- Achar que a pessoa, por ser mais velha, não perde peso, não é verdade mesmo. Minha experiência nesses casos [de obesidade mórbida] é de que não é preciso submeter o idoso a cirurgia bariátrica. Mudanças no estilo de vida e na alimentação e acompanhamento com endocrinologista mês a mês ou a cada três semanas fazem diferença. Pacientes mais velhos tendem a ter autoestima muito baixa. Há também as comorbidades. Quanto mais velho, mais risco de diabetes, osteoartrite e aterosclerose, por exemplo. É preciso estar junto a esses pacientes, que também podem apresentar alguma compulsão, sempre apoiando, associando algum remédio necessário, acompanhando e não deixando que esmoreça – afirma a endocrinologista, acrescentando que, nesse processo, o médico pode estabelecer alvos, como reduzir o peso a ponto de usar uma balança até 180 kg, melhorar resultados em exames laboratoriais ou usar uma camiseta ou roupa íntima vendidas em lojas regulares, e não com tamanhos especiais, que, uma vez alcançados, motivarão o paciente a alcançar cada nova meta.


Profissional de Educação Física mestre em motricidade humana, Eduardo Netto considera que o estudo lança luz sobre a relação entre envelhecimento e obesidade. Diretor técnico da rede de academias Bodytech, ele comenta que tende-se a considerar que engordar é algo inevitável com o avançar da idade. É verdade que há fatores que impactam na balança: a perda massa magra, processo que começa a partir dos 40 anos e é muito prevalente entre os idosos, as mudanças no metabolismo e comorbidades combinadas a hábitos como comer mais e reduzir as atividades físicas. Mas, quando a obesidade é tratada de forma multidisciplinar, Netto afirma que é possível obter bons resultados.


– Não adianta a pessoa mudar o estilo de vida sedentário e continuar comendo mal. Obesidade é um problema multifatorial. Com um programa de emagrecimento bem elaborado tem como dar certo. A atuação tem que ser multidisciplinar e a gente não pode generalizar as recomendações, que devem ser individualizadas – considera o profissional de Educação Física.


Estilo de vida ativo e exercícios físicos

Netto destaca que o artigo sobre o estudo britânico não trata sobre um programa de treinamento que tenha sido prescrito aos participantes. Os voluntários foram submetidos a mudanças no estilo de vida. O profissional de Educação Física considera que se aos participantes fossem prescritos treinamentos individualizados que considerassem suas capacidades e incluíssem exercícios de força, que são muito importantes na terceira idade, quando há perda de massa magra, e caminhadas, por exemplo, seria possível notar uma influência positiva nos resultados. Contudo, o profissional de Educação Física considera que a pesquisa traz uma mensagem ainda mais importante: para perder peso, deve-se mudar o estilo de vida.


– O que faz a diferença em qualquer processo de emagrecimento, não só do obeso mórbido, não é o que a pessoa faz na academia, mas fora. É preciso mudar o comportamento de uma atitude sedentária para um estilo com mais atividade física no dia a dia. A pessoa pode cozinhar mais e comprar menos comida pela internet, deixar de usar o controle remoto e o telefone sem fio, levantar-se a cada 30 minutos e sair para andar com o cachorro. Claro que o que realiza na academia ajuda, mas o que faz no resto do seu dia é o que fará grande diferença entre emagrecer ou não – pondera Netto.


Membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem) e da Sociedade Europeia de Endocrinologia (SEE), Barca argumenta que, embora muitos fatores influenciem no ganho de peso, para enfrentar esse problema é preciso equilibrar a conta entre ingestão e gasto calórico. A médica comenta que, no caso de obesos mórbidos idosos, ainda que não seja possível recomendar uma corrida, dá para indicar que a pessoa caminhe ou que faça uma dança, dependendo de suas preferências. No entanto, a adoção de um estilo de vida mais ativo que inclua atividades que garantam mais movimento para o dia a dia já será suficiente para aumentar o gasto de energia diário.


– Mexa-se mais. Não peça para o seu marido ou sua mulher buscar um café ou um copo d'água para você. Levante-se para pegar. Ao assistir à televisão, levante-se para ligar e desligar. Tente subir escadas, tomando cuidado ao descer porque pode haver mais impacto. Se mora em casa, ande mais. No passado, as pessoas se movimentavam muito mais. Esses pequenos detalhes ajudam a queimar calorias e fazem diferença na perda total – assegura a endocrinologista, acrescentando que, ao adotar um estilo de vida mais ativo, com o tempo, o idoso obeso mórbido pode começar a se sentir melhor e se animar para aderir a exercícios como musculação, que o ajudarão a criar mais músculo e, consequentemente, a queimar mais calorias.


De acordo com Netto, em casos de obesidade mórbida, o indivíduo entra em um estado de prostração e inércia que dificulta a prática de exercícios. Todavia, endossa que a inclusão de atividades que permitam sair dessa condição exerce grande influência sobre gasto energético diário e possibilita que essa pessoa perca peso e ganhe um pouco de massa muscular, ainda que não realize um programa de exercícios nesse momento inicial. Netto alerta que o mesmo não acontece com indivíduos com sobrepeso ou obesidade em graus inferiores. Nesses casos, também é importante movimentar-se mais ao longo do dia, porém a perda de peso pode demandar outras abordagens.


– No caso do obeso mórbido, esse estímulo da mudança de estilo de vida é suficiente para a massa magra dele. Qualquer atividade que ele faça terá um resultado. A pessoa com sobrepeso precisa fazer um pouco mais de exercício ou adotar uma restrição mais rígida de calorias – completa o profissional de Educação Física.


Mente sã, corpo são

No estudo britânico, os voluntários contaram com suporte psicológico para enfrentamento da obesidade. De acordo com a endocrinologista, essa medida também garante o sucesso do tratamento, embora muitos idosos apresentem resistência a contar com esse acompanhamento. Barca comenta que, primeiramente, obesidade deve ser reconhecida como uma doença e, como tal, tratada clinicamente. Nesse processo, o médico identifica os fatores que levaram a pessoa a ganhar peso. Há casos em que distúrbios metabólicos ou uso de medicamentos fazem a pessoa engordar. No entanto, não se pode descartar quadros como compulsão alimentar, depressão e ansiedade


– Sabemos que há muita resistência em termos de procura de psicólogo ou psiquiatra. O paciente diz que isso é médico de louco e que não vai. O ideal seria realmente que tivesse esse acompanhamento. Quando conseguimos encaminhar [para um psicólogo ou psiquiatra], é perfeito. Mas acabamos tendo que fazer esse acompanhamento. Obesidade é uma doença e não acontece só porque a pessoa teve um distúrbio inicial, como uma resistência a insulina que aumentou a compulsão por doces e a obesidade. Mesmo nesses casos, esse acompanhamento também ajuda a aliviar a culpa do paciente, a mostrar que o que ele faz é importante, mas não depende só dele – discorre Barca.


A psicóloga Marina Vasconcellos argumenta que, excluídos os casos em que a obesidade é resultado de um problema físico, sempre há um fator emocional por trás. É o caso de quadros de ansiedade em que se desconta esse sentimento na comida, o chamado comer emocional. Portanto, é preciso um atendimento multidisciplinar para abranger todos os aspectos que podem levar um indivíduo a ganhar peso. E isso inclui o psicólogo, profissional que o apoiará a encontrar o seu próprio modo de lidar com as suas questões e escolhas.


– A cabeça precisa estar muito boa para enfrentar tudo isso e entender quais são os gatilhos da ansiedade, por exemplo, e o que leva a essa sensação de vazio que a pessoa quer preencher. Ela tem que lidar com isso na terapia, com o apoio do psicólogo. Se não, ela emagrece e engorda de novo. Há casos de pessoas que fazem cirurgia bariátrica e depois engordam, porque continuam com a mente de antes e os problemas atuando da mesma forma – analisa Vasconcellos.


De todo modo, a psicóloga afirma que o enfrentamento da obesidade envolve muita força de vontade, disciplina e capacidade de lidar com frustrações. Afinal, requer que a pessoa mude o estilo de vida com o qual está acostumada. Ela precisa deixar de comer aquilo que sempre gostou e aprender a resistir em momentos de socialização, que acontecem em torno da comida. Para tanto, o indivíduo deve estar mentalmente preparado para acreditar que essa perda de peso pode acontecer e, mais do que isso, para querer que ocorra. Não adianta iniciar esse processo por pressão das outras pessoas, por exemplo. Segundo a psicóloga, é preciso querer.


– Quando se percebe os ganhos, fica mais fácil. Ao emagrecer, a pessoa passa a ter mais vontade de fazer outras coisas e mais disposição para sair, caminhar, fazer atividades físicas e até sexo. Mas para chegar a isso tem que querer, acreditar que é possível, ter disciplina e estar disposto a passar por longos períodos de frustração. O apoio do psicólogo ajudará a lidar com isso, descobrir outras fontes de prazer e a enfrentar os problemas que levaram a descarregar na comida alguma falta que sentia – discorre Vasconcellos, sugerindo ainda que se busque exemplos de sucesso. – Veja depoimentos de pessoas que emagreceram sobre o que mudou na vida delas. Isso pode ajudar a ver que pode ser bom para você também. E se você quiser emagrecer, acredite que é possível. A vida não é fácil e a gente tem que se esforçar para conseguir as coisas. Mas todo ser humano é passível de mudança se ele quiser.

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